Texto extraído do livro Caminho de Perfeição, de Santa Teresa de Jesus, capítulo 28.
“Façamos de conta que há dentro
de nós um palácio de grandíssima riqueza, todo feito de ouro e de pedras
preciosas, enfim, algo digno de tão grande Senhor, imaginemos que depende de
nós a magnificência desse palácio, o que é verdade, pois não existe palácio tão
formoso quanto uma alma limpa e plena de virtudes. Quanto maiores forem elas,
tanto mais resplandecerão as pedras. Imaginemos que nesse palácio está o grande
Rei que desejou ser nosso Pai, e que Ele está num trono de enorme valor, o
nosso coração.
(...)
Considero impossível que, se tivéssemos o cuidado de perceber que temos tal
hóspede dentro de nós, nos entregássemos tanto às coisas do mundo, já que,
nesse caso, veríamos quão inferiores são diante das que possuímos no íntimo.
Que mais faz um animal ao ver o que o contenta senão precipitar-se sobre a
presa para matar a fome? Sim, há de haver diferença entre os animais e nós.
Talvez
riais de mim, dizendo que isso está muito claro, e tereis razão, mas para mim
foi obscuro por algum tempo. Eu bem entendia que tinha alma, mas não o que essa
alma merecia nem quem estava dentro dela, pois eu mesma tapava os olhos com as
vaidades da vida para não vê-lo. Tenho a impressão de que, se então entendesse
que nesse palaciozinho da minha alma cabe Rei tão grande, eu não O teria
deixado tantas vezes só; de vez em quando estaria com Ele e teria me empenhado
mais em não ser imperfeita. Que motivo de tanta admiração! Aquele que poderia
encher mil mundos, e muitos mais, com a Sua grandeza, encerrar-se numa coisa tão
pequena! Na verdade, como é Senhor, Ele traz consigo a liberdade e, como nos
ama, adapta-se à nossa medida.
Quando a
alma começa, o Senhor, para que ela não fique alvoraçada vendo-se tão íntima
para conter em si tanta grandeza, não Se dá a conhecer enquanto não a for
aumentando pouco a pouco nos termos que compreende ser necessário para conter o
quer por nela. Por isso eu digo que Ele traz consigo a liberdade, já que tem o
poder de tornar grande esse palácio. Tudo reside em nos entregar a Ele com toda
a determinação, deixando o palácio à Sua vontade, para que Ele ponha e tire
coisas dele como se fosse propriedade Sua. E Sua Majestade tem razão; não Lhe
neguemos o que nos pede. E como não pretende forçar a nossa vontade, Ele recebe
o que Lhe damos, mas não Se entrega de todo enquanto não nos damos a Ele por
inteiro.
Isso é
uma coisa certa e, por importar tanto, eu a recordo muitas vezes. O Senhor não
opera na alma enquanto ela não se entrega a Ele, sem empecilhos, e nem sei como
haveria de agir se assim não fosse; Ele é amigo de toda harmonia. Ora, se
enchermos o palácio de gente baixa e de bagatelas, como poderão o Senhor e a
Sua corte caber nele? Ele já faz muito por se deixar ficar um pouco no meio de
tanta confusão."
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