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Filhos: Proteger ou Preparar Para o Mundo?

Feliz o homem que teme o Senhor, e põe o seu prazer em observar os seus mandamentos. Será poderosa a sua descendência na terra. (Salmo 111, 1s)

               Proteger ou preparar para o mundo parece-me algo que se refere a privar ou expor o filho às experiências da vida. No extremo, pais superprotetores querem proteger seus filhos do mundo, limitando suas experiências com televisão, internet e até mesmo, com amigos que possam não ser bem aceitos pela família, com o intuito de preservá-los dos perigos que todas essas coisas podem trazer. Seria o que chamamos de criar os filhos numa bolha. Por outro lado, pais que criam para o mundo entendem que os filhos precisam ser expostos à realidade para aprender a lidar com o mundo e fazer suas próprias escolhas. Seria o que chamamos de aprender a se virar quebrando a cara. Obviamente, essa é uma visão simplista e genérica já que, apesar de alguns tenderem mais a superproteger e outros a criar para o mundo, com nossos filhos não é sempre “não” nem sempre “sim”, pois cada situação é avaliada particularmente.
               No Livro da Vida, santa Teresa diz: “Considero algumas vezes o mal que fazem os pais em não procurar que seus filhos vejam sempre, e de todas as maneiras, coisas virtuosas. (...) Se eu tivesse de aconselhar, diria aos pais para se acautelarem com as pessoas que têm contato com seus filhos nessa idade. É grande o perigo, já que a nossa natureza tende mais para o mal do que para o bem.”1 Lembrando-se das suas experiências na infância e adolescência, a santa recorda os caminhos errados que tomou e de como se acostumou com a vida de pecado, o que a leva a aconselhar os pais que protejam os seus filhos desses perigos. O medo de que nossos filhos venham a sofrer com os mesmos erros que cometemos nos leva a querer protege-los. Mas até onde conseguimos protege-los, visto que eles frequentam escolas e estão em contato com outras famílias e outros costumes? Mais cedo ou mais tarde eles terão que fazer suas próprias escolhas entre o bem e o mal. Os pais que dão mais liberdade aos filhos poderiam pensar: será que, tentando “esconder” deles a realidade, eles não ficariam mais propensos ao pecado por não terem aprendido a lidar com o mundo?
               A tentativa de deixar os filhos mais livres para conhecer o mundo pode ser uma boa estratégia, mas pode levar nossos filhos aos vícios e será mais difícil reverter a situação. Veio à minha mente um assunto frequente entre os pais de adolescentes que é: deixá-los ou não frequentar festas com os amigos? Expô-los às bebedeiras e pornografias seria uma boa ideia? Não seria arriscado demais? O demônio é astuto e nós somos fracos! Expor nossos filhos a esses ambientes é apresentar-lhes o demônio. E, certamente, o demônio vencerá essa batalha. como nos lembra santa Terezinha: “Creio, todavia, ser melhor não se expor ao combate, quando a derrota é certa.”2. Para o caso das crianças, um assunto recorrente é sobre deixar ou não assistir televisão. Neste caso, existe o perigo de seu filho aprender algo errado ou ficar preguiçoso ou até se viciar em televisão. Acredito que deixar os filhos livres demais é muito perigoso porque os deixamos mais expostos às tentações do demônio e o pecado sempre traz consequências dolorosas e até traumas.
               Jordan B Peterson nos remete ao pesadelo freudiano do Édipo com a seguinte frase: “É muito melhor tornar aptos os Seres que estão sob seus cuidados do que protegê-los.”3.  Isso significa que, independente da estratégia utilizada, precisamos ensinar nossos filhos a viver no mundo em que estamos e vejo que isto seja até mesmo uma obrigação dos pais. Então, como podemos ajudar nossos filhos a serem pessoas fortes e preparadas para o mundo sem que se percam nos vícios e nas condutas más?  
1.      Cuidando de nós mesmos.
Enquanto nossos filhos estão crescendo e formando seu caráter, nós somos seus exemplos e somos também pessoas que decidem por elas. Somos guias dos nossos filhos, só que um cego não pode guiar outro cego. As crianças não tem condições de julgar se devem ou não comer uma barra de chocolate inteira, ou assistir televisão o dia inteiro, certo? Até que elas aprendam a dominar os seus desejos, nós somos seus “freios”. Mas como iremos ensiná-los a fazerem escolhas certas, que permitirão que elas tenham uma vida equilibrada, quando nós não fazemos escolhas certas e não temos uma vida equilibrada? Uma pessoa que é descontrolada com a sua alimentação terá dificuldades para controlar com sabedoria a alimentação dos filhos, por exemplo. Além disso, muitas vezes nos enganamos nas nossas escolhas, e outras tantas vezes somos obrigados a escolher um caminho sem ter certeza de que é o melhor. Mas podemos escolher sempre Deus e confiar na ação do Espírito Santo! Recordo-me de outra frase da santa Terezinha que diz: “Como a torrente , lançando-se com ímpeto no oceano, arrasta após si tudo quanto encontra de passagem, assim também, ó meu Jesus, a alma que imerge no ilimitado oceano de vosso amor, arrebata consigo todos os tesouros que possui... Senhor, vós o sabeis, não tenho outros tesouros senão as almas que vos aprouvestes unir à minha. Tais tesouros, fostes vós que mos confiastes.” 4 Portanto, o segredo é concentrarmo-nos em nós mesmos, na nossa caminhada de conversão, em imergir no oceano do amor de Deus e, naturalmente, nossos filhos, que são os tesouros que Deus nos confiou, aprenderão as virtudes e se tornarão pessoas fortes e preparadas para viver neste mundo. Muitas vezes ficamos aflitos pensando em estratégias para mudar nossos filhos, seus hábitos e suas más inclinações, mas o caminho é nos concentrarmos em nós, na nossa mudança e na nossa conversão. Dessa forma arrastaremos nossos filhos para o caminho reto e da prática das virtudes.
2.      Ensinando aos filhos a Lei do Senhor.
Se nossos filhos conhecerem os caminhos de Deus, aprenderem a rezar e a tudo entregar ao Senhor, mesmo que tomem caminhos errados, pela ação do Espírito Santo, receberão a luz reveladora da verdade, que é o próprio Cristo. Confiemos na misericórdia de Deus! Ele é bom conosco e cuida de nós quando tomamos caminhos errados, portanto, cuidará também dos nossos filhos! E como ensinar os caminhos de Deus aos nossos filhos? Vivendo os caminhos de Deus! Não podemos educa-los na doutrina do Senhor se não a conhecemos. Nossas práticas de fé os ensinam à medida que eles crescem experimentando o amor e a misericórdia de Deus. Portanto, se nos esforçarmos para praticar a Lei do Senhor, estaremos naturalmente ensinando este caminho aos nossos filhos.



  1. Jesus, Santa Teresa de (1995). Livro da Vida. Edições Loyola Jesuítas, 30.
  2. Jesus, Santa Terezinha do Menino (2013). História de Uma Alma. Paulus, p. 245.
  3. Peterson, J. B. (2018). 12 Regras Para a Vida. Alta Books, p.48.
  4. Jesus, Santa Terezinha do Menino (2013). História de Uma Alma. Paulus, p. 277.

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